De acordo com a pesquisa “Retratos da Leitura”, promovida pelo Instituto Pró-livro, o Brasil perdeu aproximadamente 4,6 milhões de leitores em 2019. A pesquisa levou em consideração os cidadãos com mais de cinco anos que não leram nenhum livro, nem mesmo em partes, nos três meses precedentes. Cerca 48% da população se enquadra nessa situação. Os participantes atribuíram o desinteresse à lentidão na leitura (19%); dificuldade de concentração (13%); falta de compreensão (9%); e analfabetismo (4%).
A baixa fluência em leitura é um dos principais desafios nos projetos da Enlace, entre eles o Mais Arte, que atende meninas de 07 a 14 anos no contraturno escolar. Algumas alunas chegam com problemas na alfabetização e outras lendo em uma velocidade abaixo da esperada para a idade, déficit que impacta na capacidade delas de apreender os conteúdos que estão sendo vistos em todas as disciplinas.
Para enfrentar este problema, foi criado o Clube de Leituras Vioridas, que tem como objetivo principal aumentar o grau de familiaridade das alunas com os livros. Durante a pandemia e com o adiamento do retorno das aulas presenciais, a solução encontrada foi diversificar ao máximo as formas de participação no Clube, utilizando redes sociais.
Gabriela Cruz é a voluntária por trás da idealização do projeto. Formada em Relações Internacionais e servidora do TCDF, ela atua no Mais Arte desde 2018, com foco no desenvolvimento da literacia. O modelo do Vioridas foi desenhado após muitas consultas a outros projetos semelhantes e artigos científicos sobre o assunto e reflexão à luz do que ela já conhecia sobre a realidade das alunas.
“O hábito de leitura traz muitos benefícios. A rotina do Clube permite às alunas se identificarem com as personagens e, com isso, ganharem capacidade de expressão e compreensão dos próprios sentimentos. Sem contar o aumento da capacidade cognitiva, melhorando a percepção e a compreensão cotidiana da realidade que as rodeia”, ela destaca.
As atividades do Clube desenvolvem-se em cinco etapas, pensadas para que as alunas tenham contato com o livro ao longo de toda a semana:
1) Leitura individual de um capítulo da obra.
2) Escuta do capítulo em formato de áudio livro. O áudio é uma alternativa para as alunas que ainda não conseguem ler sozinhas (turma de 7 a 10 anos), como também foi a maneira encontrada de apresentar a pronúncia correta de nomes estrangeiros e de novo vocabulário para as mais velhas.
3) Vídeo aula no YouTube, com a apresentação do Diário de Leituras da professora e proposições de questões e exemplos para as alunas trabalharem nos próprios Diários. As aulas estimulam a reflexão sobre a história e constroem pontes com a realidade das alunas, facilitando a identificação com as personagens. A idade das protagonistas de cada obra é compatível com a idade das alunas de cada turma.
4) Participação pelo Instagram, a partir de postagem de “quizzes” e ilustrações sobre as histórias trabalhadas, abrindo espaço para as alunas compartilharem seus comentários sobre a leitura umas com as outras.
5) Registro individual das alunas no Diário de Leituras sobre o capítulo trabalhado ao longo da semana.
Para as alunas de 07 a 10 anos, o título selecionado foi “O Saci”, de Monteiro Lobato, e para as mais velhas, de até 13 anos, a obra escolhida foi Anne de Green Gables, de Lucy Maud Montgomery. O principal critério para a seleção foi a potencial identificação das alunas com as personagens e os ambientes narrados.
E Gabriela não poupa esforços para facilitar o acesso das meninas às páginas. Ela mesma está narrando os livros em voz alta e disponibilizando em um canal de áudios, expandindo o acesso. As alunas são incentivadas a aproveitar os momentos em que estão fazendo atividades manuais para ouvir a história.
A escolha dos livros também teve como intuito colocar as alunas do Mais Arte em conexão com as coleções de que fazem parte. “Saci é porta de entrada para a leitura dos volumes da coleção ‘Reinações de Narizinho’ e a série ‘Anne’ tem vários outros volumes”. Ela incentivou amigos e familiares a doarem um exemplar do livro para cada aluna e espera continuar a mobilização para adquirir as duas coleções e presentear a aluna que tiver participado mais intensamente das atividades.
Gabriela também ensina com o exemplo. Encantada com a leitura, ela conta que deve o hábito ao pai, que a incentivava desde pequena. A paixão nasceu nessa época e só cresceu. “Eu recebi muito, inclusive pela leitura. No Mais Arte posso retribuir uma pequena parte disso”.